Destruidor de Montanhas


Não te preocupes, que está tudo bem! A maior parte das vezes não está. Mas chegamos a tal ponto de negação que até o óbvio deixa de o ser. Há a sensação de um cansaço de quem teve tudo (ou pode ter) e ficou vazio e nada leve. Reparem na expressão "nada leve", porque é um paradoxo. O Destruidor de Montanhas é como Sansão, apenas as destrói para morrer soterrado.


 


Tenho medos...
A força destes dedos;
Destruidores de montanhas!
Coisas estranhas,
Que querendo construir,
Tudo em que toco,
Começa a ruir!
O meu peito,
É tão oco...
Do que fiz,
Nada está feito!
Sou rio a fluir,
Sem nada que o pare!
Estarei ficando louco?
O que não dei,
E devia dar?
Já nada sei…
Pensando ser sábio,
Não passo de um idiota…
Saudoso lábio,
Que o teu espera,
Da tua voz a nota,
Que já não canta!
Silêncio cobrindo,
Esta rota manta.
Jardim lindo,
Sem nenhuma flor;
Secou,
Murchou o amor!
Talvez fosse este sal,
Que cai sem ser por mal,
Talvez seja da idade,
Ou a simples gravidade.
Eu sei que comigo,
É mais fácil cair,
Ser só amigo,
Braços que não servem de abrigo.
Deixa-me partir, veleiro amaldiçoado;
Pelo tempo sempre atraiçoado;
Sempre em contra-ciclo, dissonante,
Sempre amigo, nunca amante!
Sou pragana ao vento,
E a minha vida é tormento,
Talvez não saiba amar!
E devo afogar,
Nas ondas desse mar,
Que me escorre pela face...
Deixa que o tempo passe.
Um dia nada importará!
E se o teu filho junto à minha campa perguntar:
-- Quem aqui está?
Sai dali depressa, a correr,
Por favor, apenas vai!
Pois podias tentar-te a dizer:
“Alguém que queria ser teu pai!”
  

 

Esgotamento



Dou conta de um cansaço que me esgota. Um imenso cansaço que me inunda o peito e o afoga. Não é o mar, mas é um. E neste a correnteza dos dias é a torrente que me cansa, agora que esbracejo para me manter à tona dos dias. E esgotei-me. Sou um barco vazio e sem remos, levado na correnteza...

Sei de esperanças que duraram menos de uma vida,
E por isso não foram a última coisa a morrer.
Sei de amores eternos nunca consumados,
Esgotados no frenesim dos dias,
Em circunstâncias agrestes.
Sei de personalidades nunca acabadas,
Construções sempre em ruínas,
Campos de pedras, um deserto.
Hoje é o fim de todos os caminhos;
Onde o peso de tudo o que não foi,
Não nos deixa avançar mais;
Esgotada que foi a força, a esperança e o amor.